Avelino Ferreira, 63 anos, brasileiro, casado, sete filhos, sete netos. Jornalista; escritor; professor de Filosofia.







terça-feira, 4 de agosto de 2015

O que é e o que representa o 06 de agosto

Origem e significado do 06 de agosto

Com base em relatos dos apóstolos (do grego apóstolos ou do latim apostolu, que significa enviado, mas que também quer dizer aquele que evangeliza; propagador de qualquer idéia ou doutrina) Mateus, Marcos e Lucas (estes últimos não viveram na mesma época do Nazareno), Jesus subiu com Pedro, Thiago e João ao Monte Tabor e aí se transfigurou (mudou sua aparência, apareceu em estado glorioso, iluminado) perante eles. Teria sido no dia 06 de agosto. Esta data passou a ter uma grande significação para os seguidores das idéias de Cristo. A partir do século V, a transfiguração passou a ser comemorada pelos cristãos, inicialmente de forma tímida. Só no início da Modernidade é que a data tornou-se um símbolo considerável.

         Para comemorar a vitória das tropas cristãs sobre os turcos, que ameaçavam a liberdade da Europa, em 1457, a transfiguração de Jesus Cristo serviu de pretexto para o Papa Calisto III (escolhido em 1455, exercendo o cargo até 1458) reforçar o cristianismo. Ele estendeu as comemorações dessa data à toda  cristandade, em memória daquele feito, ou seja, a vitória dos cristãos sobre os turcos.

         O significado do 06 de agosto, pelo menos em Campos, não é conhecido pela maioria da população. Muitos acreditam que a denominação da Vila  foi instituída pelo mandatário da Capitania, Salvador Corrêa de Sá e Benevides para auto-homenagear-se, já que teria ele nascido a 06 de agosto. Em entrevista à Rede Record de Televisão o senador Marcelo Crivela fez referência à data dizendo tratar-se do aniversário de Salvador Corrêa.

Porém, mesmo os leigos não sabendo o motivo, comemoram a data que, segundo Pius Parsch (no livro O Santo do Dia) “é importante para os cristãos contemplarem com respeito e adoração o Cristo Deus encarnado”. É ver em sua transfiguração a imagem da futura transfiguração dos cristãos, pois todos esperam o Salvador, que transformará o corpo dos mortais à semelhança de seu corpo glorioso. Os cristãos devem, portanto, constantemente trabalhar visando a transfiguração, pela prática da vida interior e espiritual. Essa transfiguração, de certa forma, já se realiza na comunhão, considerada “germe de glória e penhor da nossa ressurreição futura”. 

         É importante registrar que o mês de agosto foi  criado pelo imperador romano Júlio CésarEle viveu no século anterior a Cristo (102 a 44 a.C.) e, como imperador,  no ano 46 a.C. pediu ao astrônomo Sosígenes para rever o calendário e sugerir meios de aperfeiçoá-lo. Com base nas idéias de Sosígenes, Júlio César ordenou aos romanos que não considerassem a lua no cálculo de seus calendários. Dividiu o ano em 12 meses de 30 dias e 31 dias, com exceção de fevereiro, que ficou com 28/29 dias. A cada 04 anos, esse mês teria 30 dias. O início do ano, até então, era 1º de março e Júlio César decidiu que seria 1º de janeiro.

         Em homenagem a Júlio César, os romanos mudaram o mês quintilis para julius (julho). Depois, para homenagear Augusto César, que viveu de 63 a 14 a.C. e que foi Imperador de 27 a 14 a.C.), o Senado Romano decidiu que o mês sextilis passasse a ser denominado Augusto (agosto). Conta a lenda que o Senado também acrescentou mais um dia a agosto (que só tinha 30 dias) para que tivesse o mesmo peso de julho, ou seja, os dois imperadores homenageados estariam no mesmo patamar. Para tanto, tiraram um dia de fevereiro. O calendário juliano foi amplamente utilizado por cerca de 1500 anos. Foi ele que tornou possível o ano de 365 dias e 1/4. Mas era 11 minutos e 14 segundos mais longo que o ano solar.

         Ao leitor pouco familiarizado com a história, explicamos que César (do latim Caesar) era o título dos imperadores romanos, acrescentado ao nome de todo imperador romano do fim da República até o império de Adriano (que viveu do ano 76 ao ano 138 d.C.). Na Alemanha, Adolf Hitler era o novo César, imperador do mundo e que na língua germânica se escrevia Kaiser. Também os imperadores russos adotaram o César que, naquela língua, é Czar

         A explicação sobre o calendário é importante porque: primeiro, a transfiguração de Jesus teria ocorrido em agosto, ou seja, um mês que foi criado pelos romanos, sabidamente perseguidores de cristãos, para homenagear um imperador (numa época ainda não cristã); e segundo, porque, mesmo com 12 meses, permaneceu a denominação anterior para os demais, assim, o ano termina em dezembro, de dez, mas nos referimos ao mês como doze. Assim como novembro é nove e, para nós, é onze. Outubro é oito e, para nós, é dez etc. No caso de quintilis (julho) e sextilis (agosto), que significam cinco e seis, registre-se mais uma vez que o ano começava em março. Assim, o quinto mês era julho e o sexto, agosto, diferentemente da pós-mudança, quando o início do ano passou a ser janeiro.

         Em 1582 o Papa Gregório XIII, seguindo conselho de astrônomos, corrigiu a diferença entre o ano solar e o calendário juliano, ordenando a retirada de dez dias de outubro. Assim, o 05 de outubro de 1582 passou a ser 15 de outubro. Este mesmo Papa decretou que fevereiro teria um dia a mais nos anos centenários que fossem divisíveis por 400 (como 1600, 2000) mas não nos outros (como 1700, 1800, 1900). Assim o calendário juliano, aperfeiçoado pelo Papa Gregório, passou a ser conhecido como calendário gregoriano.

         Pois bem, quando os portugueses aportaram no Brasil, trouxeram os ensinamentos cristãos, o seu calendário e a importância das suas datas religiosas. Cristãos eram os que exterminaram os nativos da planície, os goitacás. Também os que dominaram a Capitania de São Thomé, depois, Paraíba do Sul, até a elevação à  Vila, em  29 de maio de 1677, com a denominação de Villa de San Salvador dos Campos, uma  realização do ex-governador do Rio de Janeiro e dono da Capitania (que depois passou para seus filhos) general Salvador Corrêa de Sá e Benevides (ou Benavides). A transfiguração de Jesus, que tinha muita significação entre a cristandade na Europa, foi introduzida no Brasil, como se observa, pelos portugueses que, a despeito de escravizarem índios e negros, eram fervorosos cristãos.

         Como o fundador da Vila tinha o nome de Salvador, o 06 de agosto, festa maior da cidade de Campos, gerou - e ainda gera - especulações e afirmações absurdas, protagonizadas por memorialistas segundo os quais o 06 de agosto é comemorado por ser a data de nascimento de Salvador Corrêa de Sá e Benevides, que deu à Vila seu próprio nome. Não explicam, porém, como a capital da Bahia também se chama São Salvador. Nem como a Igreja Católica perpetuou a data, comemorando-a com fervor, mesmo após todas as transformações internas ocorridas em todo esse tempo. Seria uma insensatez os católicos comemorarem uma data que faz referência e perpetua a memória de um general.     
Esta obra pretende dar um fim a esta ignomínia, registrando a festa do padroeiro de Campos e explicando a origem da comemoração do 06 de agosto. Esclarece para os leitores que muitos  estudiosos da nossa história estão enganados ao afirmarem que o general, ao (re) construir, em 1652, a capela (onde depois foi erguida a Igreja de São Francisco de Assis), dedicou-a a São Salvador, numa homenagem ao pretenso santo do seu nome e, como não existe nenhum santo chamado Salvador, ele estaria homenageando a si próprio. Também esclarece que Salvador Corrêa de Sá e Benevides não nasceu no Rio de Janeiro, em 06 de agosto de 1594, como procuraram demonstrar esses mesmos memorialistas. 

         O erro é admissível quando se tenta encontrar a verdade. Mas a busca pela verdade deve ser permanente. Para dirimir dúvidas acerca dessa questão da data de nascimento de Salvador Corrêa de Sá e Benevides (já que muitos acreditam que o 06 de agosto seria uma festa em homenagem ao donatário da Capitania), decidimos incluir neste trabalho alguns dados sobre aquele general.
         O escritor Charles Ralph Boxer, numa análise minuciosa da vida de Salvador Corrêa de Sá e Benevides em seu livro Salvador de Sá e a Luta pelo Brasil e Angola - 1602/1686, traz sua árvore genealógica e assegura que, por informações prestadas pelo próprio general à Mesa da Consciência e Ordens, em 1644, ele nasceu em Cádis, em 1602, no porto de Andaluzia. Não há registro do dia e mês de seu nascimento, mas Boxer arrisca os meses de janeiro e fevereiro para o nascimento do primeiro filho de Martim Corrêa de Sá e Maria de Mendoza y Benavides. O bebê recebeu o nome em homenagem ao seu avô.


         “Quando nasceu Salvador, seu pai estava no Brasil ou a caminho de Portugal. As declarações de Salvador à Mesa da Consciência e Ordem foram prestadas quando ele tornou-se Chantre  (palavra francesa que significa cantor ou funcionário eclesiástico que dirige o coro da igreja) da Catedral de Lisboa e Cavaleiro da Ordem de Cristo, em 1644.         Dessa forma, torna-se sem efeito os dados contidos em livros de bibliógrafos portugueses e brasileiros, segundo os quais Salvador Corrêa de Sá e Benevides nasceu no Rio de Janeiro, em 1594”. Até porque seus pais, Dona Maria e Martim Corrêa de Sá casaram-se em 1600 ou 1601.

(Trecho do meu livro sobre a Festa de São Salvador)

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